Luiz Carlos Corrêa Carvalho
São as águas de março fechando o verão
É a promessa de vida no teu coração
Tom Jobim
A safra 2022/23 teve um início postergado e lento nos meses de abril e maio principalmente, e agora a moagem será intensificada. Com mais de metade da moagem já realizada no início de agosto, pode-se dizer que o momento atual, embora não pareça, é crítico para os produtores especialmente no que diz respeito à qualidade da matéria-prima. Também é para o desenvolvimento da safra 23/24: as decisões de como e até quando processar, qual o manejo a ser adotado em termos de controle de plantas daninhas, pragas e doenças, são fatores críticos que determinarão, juntamente com as condições climáticas, o destino da produtividade nos próximos ciclos.
Em um cenário de incertezas, a intensidade e a distribuição das chuvas nos próximos meses, em especial setembro, outubro e novembro, serão fundamentais para determinar os impactos à safra atual, 2022/23, bem como à safra futura, 2023/24.
Baixos valores de qualidade de matéria-prima é o que se vê até a metade da safra 2022/23. Nesse sentido, acelerar a moagem nesse momento, quando o ATR (certo ou não, a principal métrica de qualidade de matéria-prima no Brasil) atinge naturalmente seus valores máximos devido a restrição hídrica, é crucial para a recuperação do baixo valor médio acumulado até o momento. Pode ainda melhorar como já ocorreu em outras safras, tais como a 2017/18 e a 2019/20.
Chuvas, no atual momento, representariam para a safra 2022/23 (com exclusão óbvia do próximo ciclo) nada além de atraso à operação de colheita e possíveis impactos negativos à qualidade da matéria-prima. Se de fato isso acontecer, a safra poderá se alongar e a recuperação do ATR médio acumulado pode naufragar. A utilização de maturadores será fundamental para que a qualidade da cana atingida nos meses de seca não seja de toda perdida, mesmo que no atual momento seu uso possa parecer desnecessário. Nesse momento, chuvas representam um grande alívio, pois implicam que a retomada de crescimento de plantios e soqueiras já colhidas será mais rápida e intensa. Assim sendo, é um cenário oposto ao anterior, quando as chuvas, nesse momento, mais atrapalhariam do que ajudariam a safra. O grande desafio aqui diz respeito a realização adequada dos tratos culturais, ou seja, da adubação, do controle de plantas daninhas e das pragas do solo e da parte aérea da cultura.
As desventuras climáticas de 2021/22, com seca prolongada, geadas e incêndios, somadas ao aumento de custo vertiginoso, levaram muitos produtores a reduzirem seus investimentos nos canaviais, com fertilizantes, seja com insumos químicos. Essa condição é problemática, pois a cana-de-açúcar, enquanto cultura semi-perene, tende a acumular os ‘desaforos’ e ‘maus-tratos’ que recebe ao longo dos anos e a devolvê-los eventualmente. Dessa forma, canaviais que acumulam falhas de plantio ou soqueira oriundas de 2021, bem como aumento na ocorrência de plantas daninhas e pragas, representarão desafios para a formação da safra 2023/24.
A orientação técnica é que os tratos culturais das soqueiras acompanhem a colheita, a qual será possível em muitas regiões já que as condições de umidade em 2022 são relativamente melhores do que as de 2021. Assim sendo é fundamental que o controle de ervas comece o mais cedo possível: primeiro para reduzir eventuais danos colaterais às plantas de cana-de-açúcar e, segundo, porque serão necessários repasses nas áreas. Outro ponto de atenção estará relacionado a necessidade de herbicidas de bom residual, pois as condições de umidade, embora superiores as de 2021, ainda são limitantes.
Enquanto isso, as pragas também merecem sua atenção. No período seco pragas de solo (em especial Sphenophorus levis) tendem a demonstrar seus maiores impactos, os quais podem passar despercebidos durante períodos chuvosos. É essencial que o produtor se mantenha atento, especialmente aqueles que tem canaviais mais velhos e, portanto, mais susceptíveis a eventuais danos por pragas e sua interação com o clima adverso. Com as falhas de soqueiras ocorridas em 2021/22, muitos produtores, que haviam ‘relaxado no controle’ estão mais atentos e tem intensificado o controle em 2022/23, o que representam grande evolução. A dúvida em 2022/23 recai sobre o controle de pragas da parte aérea, como broca e cigarrinha, que no último ciclo tiveram sua ocorrência retardada/reduzido devido as condições climáticas de 2021 (seca, geadas e incêndios) e o desenvolvimento atrasado dos canaviais. Em caso de chuvas ocasionais já no inverno é possível que ocorram fluxos antecipados dessas pragas e é importante que o produtor esteja atento a essa condição. O controle de qualquer praga é mais eficiente sempre que iniciado precocemente, quando o problema ainda é ‘pequeno’, evitando-se sua multiplicação exponencial.
Em um cenário de ocorrência antecipada das chuvas, é preciso que os produtores se relembrem que as diferentes condições ambientais geram variações não apenas no desenvolvimento das culturas agrícolas, mas também de seus ‘adversários’. Por isso, todo cuidado é pouco e o produtor tem de ficar atento: 2023/24 pode vir a ser a safra de uma retomada efetiva do setor após o traumático 2021/22 mas, para tanto, será necessário muito esforço e atenção redobrada.
Uma aceleração de colheita anteciparia o período 2022 da safra 22/23, contando com eventual março/23 roubando canas da safra 23/24, virando estatística 22/23. Mas isso dependerá das “chuvas de março” de Jobim.
Os preços do etanol estão ainda com margem, apesar da queda pelas ações de governo nos impostos. Os do açúcar estão agora melhores e o mix deverá ser um pouco mais açucareiro. Vamos vê-los bons em 2023!